domingo, 14 de dezembro de 2008

A cadeira do bolo

Se eu perguntasse às pessoas o que elas entendem por privilégio, acredito que as definições mais comuns trariam palavras como: "vantagem", "direito exclusivo" ou até mesmo "imunidade". Confesso não me encontrar em nenhuma dessas palavras, ou melhor, nenhuma delas faz sentido quando usadas para descrever o que eu entendo por privilégio. Ok, sei que não sou autora de nenhum dicionário tampouco de um livro de significados, nem tenho pretensão para tal. Mas, alguns momentos me fazem questionar qualquer Aurélio...Hoje posso dizer que para mim privilégio é viver para ouvir um "que bom que você veio", é ver alguém que recebe um presente fazer questão de ler as "beiradinhas" dele para depois colocá-lo sob a cama, é ganhar talheres brancos para almoçar, é poder trocar olhares durante as conversas no cabeleireiro, é poder provar Melissas direto da prateleira, é morrer de rir por não saber controlar a mangueira de água, é contar as fatias de lagarto para rechear o pão, é saber dividir a torta de cebola matematicamente, é confundir os nomes das tias e levar xingo por lavar a louça. Para mim privilégio é poder enquadrar a máquina fotográfica enquanto os pedidos são feitos, é poder perguntar:"por que essa cadeira está no bolo?", é fingir que montou o cubo escondendo os buracos, é dormir e acordar na mesma posição, é comer torta gelada, é fingir não ver as bolinhas recheadas de goiabada, é ver a lembrancinha no dia seguinte do casamento, é escolher a cor e o tamanho do soutien novo, é poder assistir dois sorrisos escolhendo o melhor azulejo, é ter a mesa posta o dia todo. Privilégio é ver a bochecha vermelha ao comprar o que seria uma falsificação, é o som do jogo de futebol de domingo na televisão, é assistir a tentativa de fazer a entrada USB da televisão funcionar, é provar a calça sobre a calça, é ver os presentes escondidos, é ver o capricho da caixa de chá, é poder assistir as irmãs brincando pelas antigas camas, é ver a bandeja do pavê ser lambida pausadamente pela cadela da casa, é ver a disputa pelo colar mais bonito, é rir feito criança por derrubar as latinhas da parede. Privilégio é conhecer pessoalmente aqueles que estampam o porta retrato de pessoas tão iguais e tão diferentes que se amam, se desentendem, fazem as pazes e que se completam.